• Nunca é noite no mapa / It’s never nighttime in the map
    https://vimeo.com/175423925

    A cidade onde moro, vista de cima,
    neste mapa aéreo, interpolado, solícito.
    Eu estou em uma dessas ruas,
    em uma dessas casas.
    Eu estou dentro do mapa.
    O mapa não se importa se eu estou dentro dele ou não;
    mas eu estou, dentro do mapa.

    O mapa é indiferente, livre.
    O mapa não precisa de pernas, nem de asas.
    O mapa não anda, nem voa, nem corre,
    não sente desconforto, não tem opinião.
    Nunca chove dentro do mapa e não há vento no mapa.
    No mapa não há contramão nem velocidade.
    Pro mapa não tem engarrafamento, nem direção.

    O mapa é um olho desincumbido de um corpo,
    e eu estou dentro do mapa, em algum lugar.
    Mesmo que eu tente me esconder,
    o mapa me encontra, e me contém.
    Eu estou dentro do mapa.
    Aí estou eu, dentro do mapa.
    Eu estou dentro do mapa.
    Esse sou eu, dentro do mapa.
    Não tive tempo de colocar os sapatos e saí de casa descalço
    pra fotografar o mapa.

    E esse é o mapa.

    O mapa é abstrato, o mapa é livre, imaterial.
    O mapa não precisa de pernas, nem de asas...
    O mapa não voa nem corre, não sente desconforto, e não tem opinião.
    E eu estou dentro do mapa, para sempre.
    Surpreso ao ver de perto o mapa
    tomar a forma de uma viatura.
    Flagrado no momento em que fui acometido de um súbito desejo
    de tentar impedir que ela entrasse no beco lá de casa.
    Tomado de curiosidade, e medo.
    Como alguém que uma vez identificado, e flagrado num crime,
    decide continuar, ao invés de oferecer-se à lei.

    Foi aí que percebi a presença de um guarda.
    Ele poderia achar que eu estava incomodando o mapa,
    e poderia quem sabe interceder pelo mapa.
    Imaginei que eles teriam alguma espécie de acordo
    O guarda era como a própria viatura do mapa:
    profissional, organizado, diligente.

    O mapa sem dúvida percorreria milhares de ruas
    sem se preocupar demais de não ter conseguido entrar direito no beco lá de casa.

    Todos são iguais perante a lei
    e todos são iguais perante o mapa.
    As viaturas do mapa percorrem a cidade.
    As viaturas da polícia percorrem a cidade.
    Todos são iguais perante a lei,
    Todos são iguais perante o mapa.

    Sempre que a manifestação chega a esta altura da avenida,
    já é de noite...

    Em 2011 O mapa não podia entrar naquela rua de terra lá no fundo.
    Em 2012 O mapa ainda não podia entrar lá.
    Em 2013 também não.
    Dois anos depois...
    A viatura do mapa agora pode percorrer este espaço.
    Ao lado dessas outras viaturas...
    As viaturas da nova cidade...
    viaturas que abrem o caminho para a viatura do mapa, as viaturas da polícia e todas as outras viaturas.

    Há 200 metros de onde as máquinas passaram, aluga-se casas e quarto.
    Aluga-se casas e quarto.
    Aluga-se casas e quarto.
    Aluga-se casas e quarto.
    As viaturas da nova cidade passaram.

    Há 2 mil quilômetros dali, passaram as viaturas da polícia, imparciais,
    que garantiram a passagem das viaturas da nova cidade, olímpica,
    e em seguida passou a viatura do mapa, indiferente.
    Vai sair quem quiser, quem não quiser fica.
    Vai sair quem quiser, quem não quiser fica.
    Cidade bem policiada, cidade bem mapeada, canteiro de obras, bilheteria.
    O mapa é imparcial, não tem opinião,

    É exatamente como aquele agente de segurança privada:
    não é representante do estado, nem da comunidade,
    a sua única preocupação é o acordo que tem com a propriedade.

    Pro mapa não há governo, pro mapa não há guerra civil,
    não há golpe de estado, não há revolução.
    Nunca é noite no mapa

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